Durante a pandemia de Covid-19, o mundo aprendeu da pior forma: depender da boa vontade do mercado global para acesso a vacinas e medicamentos é uma armadilha. Muitos países ficaram na fila, enquanto grandes potências acumulavam doses. O Brasil, ciente desse cenário, decidiu mudar o jogo. Agora, está à frente de um plano estratégico que visa o fortalecimento da produção regional de medicamentos, vacinas e tecnologias em saúde em toda a América do Sul.
Mais do que um discurso político, essa iniciativa já começa a se transformar em ação. E tem tudo para reposicionar o Brasil como referência sanitária, tecnológica e industrial no hemisfério sul.
Brasil assume a liderança regional na saúde

O movimento foi oficializado na 56ª Reunião de Ministros da Saúde do Mercosul e países associados, em junho de 2025. Na ocasião, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, defendeu a integração da produção regional como forma de promover autonomia sanitária, melhorar o acesso da população a tratamentos essenciais e reduzir a dependência externa.
Em julho, o Brasil assume a Presidência Pro Tempore do Mercosul na área da Saúde, ganhando protagonismo para liderar a implementação de políticas conjuntas, negociações internacionais e investimentos em tecnologias emergentes. Um dos focos será consolidar parcerias com a União Europeia para fomentar a transferência de conhecimento técnico e científico.
Por que o fortalecimento da produção regional é urgente
Há três razões principais que explicam a importância dessa mudança estratégica:
1. Redução da vulnerabilidade internacional
A pandemia escancarou os riscos da centralização global da produção de medicamentos e vacinas. Ao desenvolver infraestrutura local, o Brasil e seus vizinhos poderão responder com agilidade às emergências sanitárias.
2. Geração de tecnologia e inovação local
Com investimentos em centros como Fiocruz, Butantan e Embrapii, o Brasil quer internalizar plataformas tecnológicas como a de RNA mensageiro (mRNA), capazes de gerar vacinas modernas para diversas doenças.
3. Garantia de acesso para todos
Produzir na América do Sul também significa reduzir custos e acelerar a distribuição. Isso favorece especialmente as populações mais vulneráveis, que historicamente são as últimas a receber insumos em momentos de crise.
Estratégias que serão lideradas pelo Brasil
A proposta brasileira inclui uma série de ações articuladas, tanto no nível regional quanto global:
- Parcerias bilaterais e multilaterais com países europeus para importar tecnologia e formar profissionais.
- Integração produtiva entre os países do Mercosul, com especialização por tipo de produto ou plataforma.
- Criação de centros regionais de excelência em saúde pública e tecnologia sanitária.
- Alinhamento com os princípios da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Acordo de Pandemias, garantindo sinergia com normas internacionais.
O que já está em andamento no Brasil
Apesar de parecer um projeto de médio prazo, muita coisa já saiu do papel. A seguir, veja os principais investimentos e frentes em andamento:
Projeto | Descrição | Investimento estimado |
---|---|---|
Fiocruz – Plataforma mRNA | Desenvolvimento de vacinas contra Covid, Zika e Influenza com tecnologia mRNA | R$ 100 milhões |
Butantan – Unidade de Biotecnologia | Nova linha de produção para vacinas com tecnologia de RNA e proteínas recombinantes | R$ 60 milhões |
Embrapii – Centros de Competência | Formação de profissionais para produção de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFA) | R$ 60 milhões |
Compras Públicas Regionais | Alianças para garantir demanda e viabilidade econômica das fábricas locais | Não divulgado |
Parcerias com União Europeia e OMS | Negociações em andamento para importação tecnológica e cooperação científica | Em estruturação |
Esses dados evidenciam que o Brasil não apenas discursou — ele já está executando.
A produção regional como ferramenta de justiça social
Um dos grandes objetivos desse movimento é combater as desigualdades no acesso à saúde. Com produção próxima dos territórios mais carentes, espera-se:
- Reduzir o tempo de chegada de vacinas a áreas remotas;
- Tornar medicamentos mais baratos por cortar custos de importação e logística;
- Garantir que países menores como Paraguai e Bolívia também tenham acesso regular a produtos essenciais.
Esse novo modelo quebra a lógica antiga, onde países ricos decidem quem recebe, quanto e quando. Com a produção regionalizada, o poder de decisão volta para as mãos da América do Sul.
O papel da ciência brasileira na virada de chave
Historicamente, o Brasil tem tradição em saúde pública e ciência e esse novo cenário reforça esse papel. A Fiocruz, por exemplo, foi essencial na produção da vacina contra Covid-19. Agora, com a inclusão de novas tecnologias, o país quer se posicionar na fronteira científica de produção de imunizantes.
Além disso, a combinação entre universidades, centros tecnológicos e investimentos em inovação abre caminho para a formação de novos polos de biotecnologia que podem beneficiar também o setor privado e exportações no futuro.
O que muda para o cidadão comum
Talvez a pergunta mais importante: como isso afeta quem está do outro lado, esperando uma vacina no posto ou um remédio no SUS?
A resposta é simples: com mais vacinas sendo fabricadas aqui, os prazos diminuem, a fila anda e o risco de faltar produto em momentos críticos cai drasticamente. Além disso, o país se fortalece para enfrentar novas pandemias que, como todos sabem, infelizmente não são eventos raros.
Conclusão
O Brasil decidiu agir e não mais apenas reagir. O plano de fortalecimento da produção regional de medicamentos, vacinas e tecnologias em saúde é um passo ousado e necessário diante dos desafios que o mundo enfrentou recentemente.
Ao assumir a presidência do Mercosul na área da saúde e liderar investimentos locais robustos, o país se posiciona como centro técnico, científico e estratégico da América do Sul. Mais do que protagonismo político, é uma chance real de garantir acesso justo, inovação nacional e resposta rápida às crises.
Se tudo caminhar como planejado, o Brasil pode deixar de ser apenas um consumidor de tecnologias para se tornar fornecedor, líder e referência em soberania sanitária no continente.
Fonte: Redação